Dilexit nos – “amou-nos”
Dom Edgar Xavier Ertl – Diocese de Palmas-Francisco Beltrão
Papa Francisco publicou, no dia 23 de outubro de 2024, sua 4ª Carta Encíclica sobre “o amor humano e divino do Coração de Jesus Cristo”: Dilexit nos – “Amou-nos”, diz São Paulo referindo-se a Cristo (cf. Romanos 8,37). O texto reúne reflexões de textos do magistério e uma longa história que remonta às Sagradas Escrituras, para repropor hoje, a toda a Igreja, o culto ao Sagrado Coração de Jesus, repleto de beleza espiritual “a um mundo que parece ter perdido o coração”, como o próprio Papa anunciou, em 5 de junho passado.
São 220 robustos números distribuídos em 5 capítulos e uma centena de subtítulos para que o leitor se mantenha atento ao conteúdo apresentado. É uma leitura espiritual, ou melhor, uma catequese de grande relevância para entendermos o amor de Deus em Jesus Cristo, pela salvação da humanidade. Disse Jesus aos discípulos de ontem e hoje: “Chamei-vos amigos” (João 15,15). O seu coração aberto precede-nos e espera-nos incondicionalmente, sem exigir qualquer pré-requisito para nos amar e oferecer a sua amizade: “Ele amou-nos primeiro” (cf. 1 João 4,10). Graças a Jesus, conhecemos o amor que Deus nos tem, pois cremos nele (1João 4,16) lemos na introdução da encíclica.
Vamos ao 1º capítulo: A importância do coração”, escreve Francisco: “Para exprimir o amor de Jesus Cristo, recorre-se frequentemente ao símbolo do coração. Há quem se interrogue se isto atualmente tenha um significado válido. Porém, é necessário recuperar a importância do coração quando nos assalta a tentação da superficialidade, de viver apressadamente sem saber bem para quê, de nos tornarmos consumistas insaciáveis e escravos na engrenagem de um mercado que não se interessa pelo sentido da nossa existência” (n. 2).
No 2º capítulo, o Papa Bergoglio discorre os gestos e palavras de amor e diz que “o Coração de Cristo, que simboliza o centro pessoal de onde brota o seu amor por nós, é o núcleo vivo do primeiro anúncio. Ali se encontra a origem da nossa fé, a fonte que mantém vivas as convicções cristãs” (n. 32). Já no 3ª capítulo, o papa apresenta-nos que este ó coração de Jesus que tanto nos amou e por isso a devoção ao Coração de Cristo não é o culto a um órgão separado da Pessoa de Jesus (n. 48). O 4º capítulo tem como tema fundamental que é o amor que dá de beber, buscando na Sagrada Escritura os elementos inspiradores desta catequese.
“Amor por amor”
No 5º e último capítulo da encíclica o papa fala que o amor aos irmãos não se fabrica, não é fruto do nosso esforço natural, mas exige uma transformação do nosso coração egoísta. Nasce então espontaneamente a célebre súplica: “Jesus, fazei o nosso coração semelhante ao Vosso”. Por isso mesmo, o convite de São Paulo não era: “Esforçai-vos por fazer boas obras”. O seu convite era mais precisamente: “Tende entre vós os mesmos sentimentos, que estão em Cristo Jesus” (Filipenses 2,5), como expressão do amor de Jesus pela humanidade (cf. n. 168).
Francisco ao concluir sua reflexão sobre a amor humano e divino, adverte-nos sobre as questões atuais. Diz que hoje tudo se compra e se paga, e parece que o próprio sentido da dignidade depende das coisas que se podem obter com o poder do dinheiro. Somos instigados a acumular, a consumir e a distrairmo-nos, aprisionados por um sistema degradante que não nos permite olhar para além das nossas necessidades imediatas e mesquinhas. O amor de Cristo está fora desta engrenagem perversa e só Ele pode libertar-nos desta febre onde já não há lugar para o amor gratuito. Ele é capaz de dar coração a esta terra e reinventar o amor lá onde pensamos que a capacidade de amar esteja morta para sempre (cf. n. 218). E faz uma pequena súplica: Peço ao Senhor Jesus Cristo que, para todos nós, do seu Coração santo brotem rios de água viva para curar as feridas que nos infligimos, para reforçar a nossa capacidade de amar e servir, para nos impulsionar a fim de aprendermos a caminhar juntos em direção a um mundo justo, solidário e fraterno. Isto até que, com alegria, celebremos unidos o banquete do Reino celeste. Aí estará Cristo ressuscitado, harmonizando todas as nossas diferenças com a luz que brota incessantemente do seu Coração aberto. Bendito seja! (cf. n. 220).