OS ANIMAIS, AS SUPERSTIÇÕES E A IGNORÂNCIA HUMANA
O termo Fake News, atualmente muito usado, supostamente surgiu na Inglaterra. em 1879. As veiculações de notícias falsas sempre ocorreram e, muitas vezes, com único objetivo de atrair leitores, tática muito usada por jornais impressos do passado. O advento da internet trouxe uma facilidade da criação de verdadeiros centros de disseminação de mentiras, com objetivos dos mais variados. Por vezes, “empresas” são contratadas para criar e propagar, sistematicamente, informações inverídicas, de tal forma tão bem construídas que acabam ganhando verdadeiros “exércitos” de adeptos que disseminam ainda mais e de forma muito rápida, gerando confusão em um grupo enorme de pessoas, trazendo sérios malefícios à sociedade.
Desde sempre, as mentiras – de forma consciente ou não – circularam dentre as diversas civilizações e eras da humanidade. A disseminação de inverdades e distorções de informações, de forma inconsciente, foram ganhando o tempo, de boca em boca e perpetuam até os nossos dias. Agora encontraram terreno fértil nas redes sociais e passaram da inocência ao verdadeiro ato criminoso.
As antigas distorções de informações ou crendices, vez por outra, ganham novas versões e dificilmente conseguem ser desmentidas, efetivamente. E muitas destas coisas nascem do desconhecimento ou por crenças ou histórias nascidas a dezenas ou centenas de anos.
Dizer que aftas são causadas por problemas no estômago, por exemplo, é só um mal entendido, que percorre dezenas de anos. Isto aconteceu porque aftas são, cientificamente chamadas de Estomatites (do grego antigo: “stoma” – boca e “itis” – inflamação). Estomatite confunde-se facilmente com estômago, no entanto, inflamações no estômago são chamadas de Gastrites (do grego “gaster” – estômago). Enfim, aftas nada têm a ver com problemas no estômago. Coisas como esta, parecem inocentes, mas (e apesar de não intencional) podem trazer sérios danos à saúde, pois muitas pessoas acabam tentando realizar tratamentos caseiros para um mal que, simplesmente, não existe.
No mundo animal, vários são os exemplos destas pequenas desinformações. São fake news que trazem medo às pessoas e colocam espécies em risco e levam a atos de maus tratos e abandonos de animais.
Mesmo com tantas informações disponíveis, a rejeição dos gatos pretos, que persiste até hoje, reside na lenda de que – assim como acontece com as corujas e diversas outras espécies – trariam azar. E, assim, gatos pretos são a maioria, dentre os animais abandonados. Este absurdo surgiu ainda na Idade Média, durante a Santa Inquisição, onde associavam aos gatos, por terem hábitos noturnos e sorrateiros e pelos sons assustadores por estes emitidos, uma relação às trevas e, desta forma, aos possíveis atos de bruxaria. Como os gatos pretos eram os mais difíceis de serem vistos na escuridão, seu aparecimento, aparentemente do nada, foi logo associado à magia e feitiçaria.
As corujas sofrem deste mesmo preconceito. A superstição de que elas trariam a morte ou que estariam associadas à feitiçaria datam de muitos séculos, vindas da Africa, do Oriente Médio e da Europa. O problema é tão sério que quase levou muitas espécies à extinção; e continua trazendo risco a algumas espécies, principalmente as que habitam áreas invadidas pelo homem; é o que ocorre com a espécie Athene cunicularia, ou coruja-buraqueira, que habita matas costeiras e praias, o que levou prefeituras de vários municípios litorâneos a realizarem campanhas informativas sobre os benefícios destes animais no controle de pragas, como ratos, por exemplo.
As lagartixas (Hemidactylus mabouia ou H. frenatus), muito úteis no controle de insetos e aranhas, também sofrem muitos preconceitos por conta de crendices. A crença de que transmitiriam “cobreiro”, uma doença de pele, surgiu do fato de serem de origem africana e terem chegado no Brasil através de navios negreiros. Obviamente, toda a situação que envolvia a captura e como eram mantidos e transportados os escravos era excessivamente estressante e sanitariamente complicada, causando o surgimento de doenças em vários indivíduos ou que eram rapidamente disseminadas. O Herpes Zoster, popularmente conhecido como cobreiro, possivelmente era uma delas, pois, com a imunidade comprometida, viria à tona de forma muito severa. Varíola e Sarnas eram muito comuns, o que também, devido a falta de diagnósticos, poderiam facilmente ser confundidas com o cobreiro. Como as lagartixas eram vistas sempre presentes nos navios, logo atribuíram a elas esta carga preconceituosa que persiste até os dias de hoje.
Muitas outras lendas recaem negativamente sobre diversas espécies animais, como os morcegos, as mariposas, urubus, sapos, gambás… e estas “fake news” do reino animal estimulam perseguições e preconceitos.
Desmitificar essas crendices e superstições é muito importante; por isso a importância de conhecer um pouco mais sobre as espécies que coexistem entre nós. Não podemos, simplesmente, atribuir nossos problemas ou situações negativas, aos animais…
Está mais que na hora de assumirmos nosso desconhecimento e evoluirmos.
As demais espécies não podem – devido a ignorância humana – continuar pagando as nossas contas…