ESCREVER PARA QUEM?
(Uma crônica de Cláudio Loes)
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Já ouvi muito que deveria escrever pensando no leitor, naquele que vai se encantar com a leitura. Nem consigo numerar todas as sugestões que recebi. De todas, penso que não consegui acreditar em nenhuma, e começa a fazer sentido minha atitude. Vou comparar com o que acontece com uma empresa e seus clientes. Eu mesmo posso dar exemplos meus e que sugerem pistas do que fazer.
Quando a empresa tem um comprador de seus produtos, ela tem um problema. Louco eu? Não, com certeza! O comprador é para aquele momento, ele vai ficar brigando por preço e quantidade. Para ficar feliz por ter comprado o que ele pensa, por comparação, ter sido mais barato que em outro lugar. É mais ou menos dizer que comprou bala de caramelo mais barato da marca batatinha em relação ao caramelo mandioca. Então, se uma empresa quer, de fato, fazer a diferença e prosperar não deve procurar ter compradores.
Quando a empresa tem clientes o problema é enorme. Nos últimos anos ouvi dizer o tempo todo que o cliente é o herói e como tal deve ser tratado. Ledo engano, ele é cliente até o momento que lhe convém. A empresa não vai fazer o seu melhor (porque ela deixará de ser ela) para ser o que o cliente quiser. Aí o barco afunda com certeza.
Quando a empresa tem uma visão de seu propósito, coloca-o em prática e entrega o seu melhor. Aí ela não terá compradores ou clientes, ela terá seguidores. Seguidores de uma visão, de uma tendência. A empresa com certeza ouvirá o mercado, estará em contato com os seguidores, mas não vai perguntar para o seguidor como ela deve ser. Isso fazem aquelas que têm compradores e clientes. Neste caso, posso dizer que na grande maioria das empresas, prestadoras de serviços, com quem me relaciono (risos, agora percebi que usei sem querer “relaciono”, mas que traduz muito bem), jamais serei somente um comprador ou cliente. Sou seguidor delas. Poderia enumerar aqui, mas deixo para o leitor entrar em contato e perguntar quais são. Faço questão de responder a todos.
Tudo o que escrevi até aqui não é novidade e pode ser encontrado material farto e bibliografia extensa, em qualquer lugar.
Então, escrever para quem?
Com certeza, essa pergunta não era para você que chegou até aqui. Eu coloquei essa pergunta para mim mesmo, porque ela é uma chave importante nesse momento da minha vida. Como escritor, estou, cada vez mais, buscando os fundamentos do ser que está aqui dentro, revelando-se. Estou descobrindo que ele se revela mais pela escrita, depois pela fotografia. Em nenhuma dessas duas áreas me reconheço como expert.
Fazendo o contraponto com a empresa, percebo que não quero ter compradores. Nesse quesito, minha preocupação é menor, porque os compradores podem dar alegria para o caixa financeiro, mas eles querem aquilo que faz sucesso. Eles querem estar no grupo da sensação e do sucesso passageiro. Eles não têm propósitos. Eles podem ler um poema, milhares… e nada dizer. São aqueles que consomem para passar o tempo e podem arrotar numa roda de conversa os livros que leram. Não quero ser escritor para essa categoria.
Um passo, e vem o cliente. Aquele que leu um poema disse que a poesia estava muito boa, mas que não concordava com a minha posição. Como pessoa, às vezes, nem eu concordo com a posição do meu “eu lírico”. No entanto, pondero, aprecio e vejo que seria uma outra possibilidade, uma diversidade que surgiu, e continuamos nosso diálogo. Já o leitor cliente que vai argumentando e acaba escrevendo um texto dizendo porque não concorda com a minha ideia, está tentando me influenciar na escrita de um próximo poema. Ele simplesmente perdeu a capacidade de apreciar o processo de criação que aconteceu no poema e com ele próprio. Ele não teria escrito sua posição sobre o tema que estava no poema se o poema não existisse. Deu para entender por que o leitor cliente é um problema? Ele não quer o melhor do escritor, ele quer que o escritor escreva aquilo que ele quer ouvir. Quando ele encontrar outro que faça isso também, e mais barato, abandona-o e vai embora.
Nada de compradores e nem clientes! Qual a melhor maneira? E penso que será um conselho-incentivo para que todos escrevam. Sempre temos algo para colocar ao/no mundo, todos temos um propósito, um ser interior que quer se revelar. Quanto mais descobrirmos aquilo que somos, melhor será para a perpetuação da espécie. Lembre-se, não é o indivíduo que se perpetua e sim o todo.
Poderemos estar, um dia, em outro planeta, outra galáxia, não importa, sempre estaremos na jornada da busca do ser; portanto, traduzir essa busca e seus resultados em poemas, contos, crônicas, fotografia, aventuras com pessoas, pelas paisagens naturais, é o que devo continuar fazendo. Por esses meios, estou conhecendo melhor o meu ser no mundo. Sem nenhuma outra preocupação, a não ser somente com a busca. Aí, quem estiver se aproximando, começar a ficar junto, será um seguidor, um fã. Seguidor e fã de mim?
Claro que não! E nesse ponto é preciso todo o cuidado para não cair na tentação ditatorial ou passar a ter clientes. Aquele que segue, que troca, tem que ser sempre visto como alguém que está na mesma busca. Ela ou ele fazem parte dessas conexões na busca do ser. Não é o elogio pessoal que fará a diferença. Isso é atitude de cliente e quando muito, de comprador.
Quem segue, segue porque vê no outro a expressão de outro ser. Daí para frente não importam as coisas, o ter isso ou aquilo, e sim o caminho a ser feito juntos, em comum, em união.
Ainda vou dar uma deixa para o cliente perguntar: “O que seria o ser?”. E lamento dizer: não sei. Aqui, só coloquei aquilo que brotou do meu interior, do meu ser, que até o programa que estou usando para escrever avisou que deveria salvar, porque passei de mil palavras digitadas. Não sei mesmo, e não tenho nenhuma revelação externa que possa confortar, nem o comprador, nem o cliente, mas vou continuar escrevendo para buscar. E todos aqueles que quiserem seguir nessa busca serão sempre parte de tudo, como também eu sou parte de tudo.
Sua perspectiva Cláudio, revela um ângulo de muita originalidade. De fato, uma reflexão pertinente. Gostei, abraços.
Grato, eu só faço algum rabisco aqui e outro ali, digamos que quando toca eu sigo para buscar mais. Abraços.