Independência… ou morte? / Há o que comemorar???
(Crônica de Claudemir M. Moreira, Poema de Cleusa Piovesan)
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E cá estou eu, sentado à beira desse abismo, cratera aberta pela ignorância e fanatismo, uma incivilidade jamais vista, partindo do povo. E lá embaixo, em meio à lama, uma espécie de Estige, vejo dois lados isolados… não há mais pontes que os unam, falam línguas diferentes… poucos enxergam o que, claramente, se vê. Nem mesmo as cores das bandeiras que flamulam. Por mais que uma horda insista entre o verde e o amarelo, são só cinzas que enxergo… e é o mesmo vermelho que se derrama… seja no verbo, seja na carne… o mesmo que, supostamente, foram induzidos a odiar.
Sete de setembro até poderia representar alguma coisa, mas nunca tivemos independência… nem econômica, nem social, nem cultural… sequer política. Somos o eterno Brasil Colônia… o celeiro do mundo, a lixeira do mundo… o serviçal. A primazia do ludíbrio. O país onde as ações e reações de insubmissão são taxadas de vandalismo. Onde os possíveis heróis da real transformação são taxados de vagabundos, vândalos, criminosos ou bandidos. E onde os reais bandidos são sublimados a heróis.
Da “independência ou morte”, só nos resta perecer…
O preponderante é o sangue que – mesmo que imaginário – corre pelas ruas. De nada adianta erguer suas bandeiras, quando, no coração, o fogo do ódio prevalece. E, afinal, nossa bandeira não representa nada além da condição de colônia. Toda aquela fábula escolar de que as cores representariam o verde das matas, o amarelo do ouro e das riquezas, o azul do céu e das águas e o branco da esperança ou do desejo de paz, é derrubada pela triste realidade da relação com o império ou ligações diretas à Coroa Portuguesa. Enfim, parece que a escolha, em 1889, foi um escárnio, algo como: “agora vocês estão livres para servir”. E essa mensagem subliminar está aí, arraigada ao destino do povo… os serviçais das vontades do resto do mundo. O povo que arruína e despreza sua cultura, que desdenha os seus, que abre as portas aos estranhos e as bate na cara dos iguais, que dá a cara a tapas por aqueles que o espolia ou que, descaradamente, despoja-lhe até mesmo da razão. O povo que deseja mal ao povo, enfim, tem o que merece.
O estado é insolente ao povo e submisso às vontades daqueles que o usurpa.
Que independência, que nada! Sejamos o celeiro do mundo e tomemos todos os venenos, e que respiremos toda a fumaça para abrir espaço à ganância dos poucos, para podermos servir aos senhorios, sem ônus, sem riscos e a custos irrisórios, ditados por eles mesmos ou às suas próprias vontades.
Vejo, hoje, nossa bandeira tingida com o laranja-avermelhado das queimadas, pelo barro deixado pelas mineradoras, pelo acinzentado dos metais pesados e outros diversos venenos que correm em nossos rios ou que permeiam o ar que respiramos, e pelo roxo, marcado pelo desespero e angústia de nosso povo… e onde haviam estrelas, hoje vejo os projéteis das constantes ameaças que sobressaltam a dignidade popular… enfim, contentem-se com nossa bandeira laranja, marrom, cinza, roxa, crivada de balas e com a descrição “salve-se quem puder”.
Independência? Não, obrigado! No momento precisamos mais de razão, de lucidez… precisamos atinar à perceptibilidade da verdade absoluta… acordar os que dormem o sono eterno da estupidez, despertar os que porfiam por ignorância…
E quando tivermos a razão absoluta, aí sim, teremos, não só a independência, como a morte da humilhação de sermos celeiro, os serviçais da ganância dos poucos, esse grande “paiol de bobagens” …
Independência…
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HÁ O QUE COMEMORAR???
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200 anos???
Oh, parto difícil!
País ainda não cresceu
Envolto em fraldas
De cagada em cagada tenta
Paga por não aprender
Não ter autonomia
Até quando o povo aguenta?
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Cidadão cheio de manias
Anda a esmo
Há crianças rebeldes
Outras abandonadas
Jovens sem perspectivas
Outros perdidos
Adultos adulterados
Enleados em corrupção
Ou frustrados
Velhos sem respaldo
No exílio de seus direitos
Massa de manobra em eleição
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Todos cidadãos de bem
Poucos com bens
Bem ou mal vivem
Não sem Carnaval
Aqui tudo acaba em festa
O povo desistiu de lutar
Mas aprendeu a ludibriar
A cada esquina uma negociata
Todos sempre a reclamar
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Não é mais Colônia de Portugal
Mas tem sua língua colonizada
Idioma abrasileirou
Sem contexto nacional
É colônia linguística
Paga pau gramatical
Não demarca sua estilística
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200 anos de batalhas
Relatadas por quem vê de fora
Mostra uma História frustrante
Que aos tropeços segue
Repetindo os mesmos erros
Mudam-se os reis
Sentam-se em trono viciado
E o país é negociado
Crente que é um gigante
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Poucos letrados
Muitos alienados
A Educação em desmonte
Espertalhões aos milhares
Demarcando territórios
Sem glórias varonis
É foco de muitos olhares
Cobiçando a exploração
Tão inocente é expropriado
Esse Brasil ainda infante
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E o cidadão que labuta
Que luta de sol a sol?
Esse não é valorizado
Sendo a base da pirâmide
Pelos de cima é massacrado
Apenas um canetaço
Dizem… decisão unânime
E o direito é retirado
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Nesse país de contrastes
Podem passar mais cem anos
Entram fulanos ou sicranos
Imbuídos em vilanias
Em golpes bem disfarçados
Revestidos de ombridade
Dizem que é a democracia
E saqueiam a nação
Em nome da liberdade
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