Por que eu escrevo?
Por Otávio Sedor
Por que? Por que? Por que? Já me perguntei, já me perguntaram. Elogios já vieram, críticas também e até alguns e-mails carinhosos e outros mais fervorosos (a maioria quando o assunto envolve política, é claro). Mas juro que, entre esses vários pensamentos profundos da vida, andei refletindo sobre isso de algum tempo para cá. Afinal, dizem que tudo tem um porquê. E eu acredito fielmente nisso.
Me lembrei que, há algumas semanas, escrevi sobre nunca se esquecer de quem ou do que nos inspira. Acredito que toda forma de expressão – inclusive a escrita – tem muito a ver com isso. E talvez essa seja mais uma das várias respostas que digo para quem me pergunta. Porém, acho que realmente a coisa é um pouco mais profunda. E o efeito que causa e que queremos causar com tudo isso também.
Bom, na verdade mesmo, tudo que escrevo é para mudar vidas, nem que seja só um pouquinho. É para deixar para as pessoas. É para ficar. A gente vai, mas tudo isso fica. As vezes, as pessoas se vão e, com a suavidade invisível do passar do tempo, são esquecidas. Escrever é insistir. É uma batalha incansável – e tão leve ao mesmo tempo – para não ser esquecido. E ser lembrado, justamente, por algo que deixamos para quem ficou. Sim, parece um pouco óbvio e manjado, mas o que deixamos registrado realmente nunca morre, isso é uma garantia.
Existe um filme de animação infantil chamado “dois irmãos” que conta com uma história bem curiosa, tanto no seu próprio roteiro como tudo que ocorreu por trás, justamente para o roteiro surgir. A história se baseia em um irmão mais velho que tem algumas lembranças do pai e outro, mais novo, que não se lembra de absolutamente nada sobre o pai. A partir disso, eles entram em uma jornada de descobertas onde o pai vai – como se fosse em forma de metáfora – surgindo aos poucos, literalmente como uma lembrança que vai se formando.
Para quem não sabe, o autor do filme realizou um grande “brainstorm” com sua equipe para definir qual história seria contada. Para isso, colou na parede várias possibilidades de enredos que se identificava, a maioria muito a ver com sua vida pessoal e sua história. Grande parte se tratava de grandes clichês, mas alguns eram mais inusitados, como a história de que seu irmão mais novo não tinha lembranças do pai e, por isso, tinha alguns sofrimentos internos e existenciais.
Durante uma pausa para o almoço, o roteirista resolveu virar alguns daqueles papeis que estavam na parede, afinal não queria que todos passassem por ali e vissem abertamente algumas de suas ideias. Porém, na verdade e de forma quase automática, ele se importou mesmo apenas com uma das histórias que estavam lá. E virou para a parede justamente o papel onde estava a história do seu irmão mais novo com seu pai. Essa era a que mais queria resguardar. Foi quando um dos seus principais assistentes olhou a cena e disse: “é exatamente essa que deve ser a história do filme”. E foi mesmo. E ficou lindo. E foi um sucesso. Não tenho dúvidas de que inspirou muita gente que se identificou com tudo que ali foi contado.
Pois é. Assim como nessa história do roteiro da animação, eu também escrevo para mostrar o que está guardado mais profundamente. Para buscar aqueles papeis que estão virados para a parede. Tudo isso porque, na realidade mesmo, o que mais “escondemos” é o que temos de melhor para mostrar. Quando colocamos nossos sentimentos para fora, coisas mágicas acontecem. Vidas podem ser mudadas. Pessoas são tocadas, se identificam, podem mudar um pouco a forma de ver, pensar e viver. Podem se libertar. Podem colocar em prática. E podem passar tudo isso adiante depois. É, acho que é por isso que eu escrevo. E que bom que você está lendo agora. É por isso que escrevo também.
