Quando o sujo fala do mal lavado
(Joceane Priamo)
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Quantas vezes já nos deparamos com indivíduos que discursam sobre honestidade, enquanto suas próprias condutas deixam muito a desejar? Ou aqueles que tecem críticas ferrenhas sobre a vida particular de outrem, mas cujas existências são um emaranhado de problemas não resolvidos? É a velha história do espelho quebrado, mas que insiste em se fazer de espelho intacto para refletir as manchas dos outros.
Nesse espetáculo lamentável da natureza humana, a crítica alheia serve como um véu para disfarçar as próprias falhas, uma tentativa desesperada de desviar os holofotes de si mesmos e projetá-los em quem, ao menos superficialmente, parece imune às mesmas tentações ou fraquezas.
É como se a projeção defensiva se tornasse um esporte, e a hipocrisia se manifesta como um escudo, em vez de um espelho. A inveja, a insegurança ou um senso distorcido de superioridade podem alimentar esse comportamento. Em vez de buscar a própria redenção ou melhoria, alguns encontram consolo em apontar o dedo, esquecendo-se convenientemente que a pessoa que mais julga com rigor é, muitas vezes, aquela que mais se esconde atrás das muralhas da negação.
É um ciclo vicioso que, infelizmente, vemos se repetir nas mais diversas esferas: da política às amizades, passando pela vida familiar, em conversas triviais, nos corredores do trabalho, nas redes sociais, onde a figura daquele que se vê impecável com um manjar de virtudes discorre as falhas alheias e nesse palco de encenação constante, a hipocrisia veste o manto da justiça.
Talvez, ao invés de apontarmos para a poeira nos olhos do vizinho, devêssemos primeiro soprar o que nos embaça a própria visão, pois, no fundo, todos carregamos nossas impurezas; e a verdadeira elegância está em reconhecê-las, não em fingir que não existem enquanto acusamos o outro de carregar uma mancha, e, essa tendência de julgar e condenar sem conhecer a fundo as circunstâncias, revela mais sobre quem julga do que sobre o julgado. Afinal, quem se propõe a lavar a própria alma raramente tem tempo ou disposição para focar a vida do outro.
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Joceane Priamo nasceu em Francisco Beltrão-PR, em 23 de maio de 1988. É formada em Letras Português e Literatura pela Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO) e Pedagogia pela Faculdade Campos Elíseos (FCE), pós-graduada em Docência no Ensino Superior, Antropologia, Educação Especial e Intelectual.
Em março de 2021, lançou seu primeiro livro, Francisco Beltrão entre Versos e Sonhos. Em 2024 lançou a coleção infantil As aventuras de Chiquinho Beltrão e sua turma. Participa da coordenação da Via Poiesis e como membro do Centro de Letras de Francisco Beltrão, é professora, escritora, poetisa e cronista.