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AOS QUE FICAM

Vivemos tempos de resistência, onde somente cada um sabe das suas dores. É difícil ver gente brigando, amizades antigas terminando, pessoas se matando – literalmente. Talvez esteja faltando o bom senso de sabermos os limites. De sabermos o espaço do outro. De sabermos que tudo começa pelo respeito. 

                Faz mais de 10 anos que eu e alguns amigos fazemos um churrasco nas quintas-feiras. Acho que a amizade, a intimidade e a ligação já são tão fortalecidas que esses dias percebi algo engraçado. Toda semana o roteiro é o mesmo, seja qual for o assunto: a gente debate, discute, fala umas besteiras, bate na mesa e fala mais alto. Mas depois, o assunto muda. O disco vira. Todo mundo dá a mão, se abraça e na quinta-feira seguinte está ali de novo. 

                Desde então, nesse tempo todo, já se passaram muitas eleições, finais de campeonato, fatos históricos pelo mundo. Namoros, casamentos, separações, filhos, trabalhos, alegrias, problemas, ganhos, perdas. A vida de todo mundo já mudou. Já conversamos sobre absolutamente todos os temas que vocês podem imaginar. Alguns pensam de uma forma, outros de outra um pouco diferente e outros de uma maneira absurdamente contrária. Mas, no fim, tudo fica bem. E já se passaram mais de 10 anos. E sabe por quê estamos ali até hoje? Porque estamos ali desde o começo. Porque na discussão, no deboche e na tragédia, todos estavam ali.  Mas no aperto, na dor, no socorro e na solidariedade, todos também estavam ali, cada um do seu jeito. Porque isso vale mais do que a politica, o time ou a religião. Porque o momento passa, mas o que é mais forte precisa ficar.

                Apesar de todas as besteiras e momentos de irritação, esse é um tipo de lição do dia a dia que me ensinou muito. E aí talvez esteja um convite para todos nós: olhar mais em volta na nossa própria vida. Observar tudo que ela pode nos ensinar sem nem precisar dizer nada, pedindo  e reclamando menos e valorizando mais o que já temos. Afinal, aconteça o que acontecer, a nossa vida vai seguir. Seja como for, mas vai. E isso talvez seja o mais próximo de uma certeza.

                Em um tempo em que ninguém mais ouve ninguém, em que tudo vira motivo para desejar o pior para quem pensa diferente, eu queria que o mundo fosse mais como a turma da quinta. Que o que realmente importa prevalecesse. Que pudéssemos debater, discutir, até se exaltar um pouco, mas que no fim a gente desse risada a abrisse mais uma cerveja. Uma cerveja para deixar passar o que não irá nos preencher. E para brindar aos que ficam.

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