O QUE A ÁGUA LEVA
Não estão faltando tapas na nossa cara. Talvez nunca tivemos tantas oportunidades universais oferecidas pelo destino para que, após um belo chacoalhão, a gente se desse conta de que menos é mais. Ou melhor, de que menos é tudo.
Depois de uma pandemia de mais de 2 anos de duração e incontáveis vidas perdidas – absolutamente do nada – e de outros desastres tanto da natureza quanto de saúde, talvez a gente tenha aprendido um pouquinho, ao menos, a dar mais valor a vida.
O episódio mais recente, com as enchentes no Rio Grande do Sul, derrubaram de uma vez por todos a “piadinha” do “não tinha nada e perdeu tudo” – que de piada não tem nada. Afinal, o “tudo” realmente aparece quando quem passa por isso se dá conta de que todo aquele financiamento no banco, correndo juros, foi embora. O carro em 72 parcelas, tão desejado, foi embora. Cada conquista – chamada de “material” – que foi motivo de comemoração depois do suor… a água levou.
Mas mais, muito mais do que isso, a enchente carregou as memórias de cada pessoa, de cada família, a história única que cada um construiu. Isso, infelizmente, não se pode comprar de novo.
Porém, dito tudo isso, no fim das contas eu só queria chegar em um dos pontos que temos em comum entre todas essas tragédias. Assim como na pandemia da Covid-19 e outras situações, muita gente foi embora com a correnteza. E as vidas que se foram são a perda mais dolorida, pois dela é feita um dos mais intensos sentimentos que podemos alcançar: a saudade. E a saudade surge da pergunta que te faço agora, para que feche os olhos por um segundo e reflita: o que acontece quando a gente morre? Se deixarmos religião ou biologia de lado por um momento e falarmos apenas de VIDA, a resposta surge leve e plena bem na nossa frente. Foi o que um dia o ator Keanu Reeves disse em uma entrevista, quando foi perguntado o que acontece quando morremos: “quem nos ama vai sentir nossa falta.”
E é isso. Na real, é isso. A família que se abraçou antes de morrer em meio as águas lá no Vale do Taquari infelizmente foi embora. Mas foi embora junta, unida, abraçada, exalando amor e transformando um gesto na maior demonstração do mundo de que a nossa ida é a saudade que deixamos nos outros. De que, mesmo com toda a desilusão das perdas materiais e das memórias da nossa história, a maior perda ainda são as vidas. Porque quando a gente morrer alguém vai sentir copiosamente a nossa falta. E isso nem a água pode levar.
