GeralVia Poiesis

AMOR DE MÃE

(Uma crônica de Cláudio Loes)

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Toda noite passo pela ciclofaixa fazendo minha caminhada. Na maior parte das vezes, nada acontece, além de alguns poucos atletas de plantão que se encontram, como os ciclistas que passam pela via e tem ainda aquela senhora, que deve beirar minha idade, e em boa forma corre muito bem, nem dá tempo para cumprimentar.

O tempo hoje está de mau humor e pregou uma peça aqui e outra ali, durante todo o dia. Quando as compras vieram do supermercado, deixei lugar para o entregador, na garagem. Resultado; não choveu. Depois, fui pegar o carro para colocá-lo de volta na garagem e tomei a maior chuva.

Mas… numa dessas noites… sempre pode ter um “mas”… resolvi desafiar a chuva. Quando estava voltando para casa, comecei a ouvir a chuva galopando pelos telhados do bairro. O ponto de ônibus me serviu de abrigo e fiquei ali para esperar a chuva passar. Escolhi um lugar mais protegido, porque o vento queria me pegar de qualquer jeito. Enfim, consegui achar um ponto seco no ponto.

Quando me virei para a via, um carro preto, pequeno, estacionou. Dava para ver uma mulher bem nova ao volante, um cesto infantil no banco do carona, na frente, e um amontoado de roupas no banco traseiro. Ela ligou o alerta do veículo, e até pensei que poderia ter dado uma pane nele. Esperei mais um pouco.

A chuva caia como nos filmes de tempestades em alto-mar. Lá de cima alguém devia estar enchendo baldes e mais baldes de água só para brincar.

A condutora saiu do carro, iluminada pela luz do poste; uma visão cinematográfica. Saiu na chuva como se fosse um dia de sol normal, à beira da praia, vestindo uma bermuda e blusa. Abriu a porta de trás e disse “Filho, levanta, me dá o teu cobertor!”. Pegou o cobertor e cobriu toda a porta de trás que recém havia aberto. Com força, fechou-a. 

Depois, pegou uma toalha que estava com o bebezinho no cesto, e foi levantando o vidro da porta da motorista, até chegar quase em cima. Entrou rápido, sentou-se, pegou outra tolha e foi cobrindo o cesto. A criança quis levantar e ela disse “Fica deitado, meu querido, vamos cuidar pra não chover na sua cabeça”. Foi aí que percebi que a porta do carona não tinha vidro.

Com um toque de Midas, a chuva, simplesmente, parou. Quem estava enchendo os baldes lá em cima deve ter se cansado. 

Rapidamente, saí da cobertura do ponto de ônibus, enquanto ela ligava o veículo. Mal havia começado a caminhar, e o carro passou por mim. Ainda ouvi a mãe cantando a música “Peixe vivo” para seus filhos, enquanto dirigia. E segui caminhando, lembrando de “… como poderei viver sem a tua companhia…”. Como poderia alguém viver sem o amor de sua mãe?

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