GeralVia Poiesis

IMORTALIDADE

(Uma crônica de Cleusa Piovesan)

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Lembrei-me do filme “O sexto sentido” em que o menino diz:

– Eu vejo gente morta!

Ao que o homem pergunta:

– Com que frequência?

– O tempo todo! – ele responde, amedrontado.

E eu também vejo, ouço, leio gente morta, que teve uma vida intensa, e que deixou grande legado, para que os que ainda estão sobre a terra possam refletir sobre suas histórias, de sucesso ou de fracasso, e aprender, com suas benesses ou com suas vicissitudes. Gente que teve uma vida turbulenta e que, muitas vezes, não suportou “a insustentável leveza do ser” (neste mundo que nos põe à prova a cada instante) e deu fim à própria vida, ou que padeceu com vícios, pulando da “ponte da vida”, precocemente.

Nem sempre uma vida de glórias e de opulência, aos olhos do público, é uma vida de felicidade. Geralmente, é uma vida de renúncias, restrições em busca de uma imagem que não condiz com seu “eu” interior, mas o caminho da fama vende a ilusão, ofuscada pelos holofotes, de que dinheiro e o poder compram a felicidade, como se ela estivesse à venda em um grande shopping ou num belchior qualquer.

Quero ver meus autores da literatura mundial, escritores, pintores, escultores, artesãos, músicos, artistas cênicos, em suas publicações na internet, blogs, páginas do Facebook, sites de literatura, Instagram, em mensagens de WhatsApp, em livros, em bancas de revista e de jornais (quase inexistentes), nas livrarias, nas feiras livres, num simples cordel, em museus, em eventos e shows, disseminando suas ideias, promovendo reflexões, contextualizando a vida em versos ou em prosa.

Quero ouvir meus cantores e cantoras preferidos, e na frequência máxima, de música erudita, clássica, tradicionalista ou popular, num vinil, num CD, num pendrive no carro, no fone de ouvido pelo celular, num podcast, seja de gente viva ou morta, e imergir no som que embala uma canção, que me embriaga a alma dessa energia semiótica que só a música me proporciona. A “canção da liberdade” que embalou os sonhos de Pedro Bala, e disseminou-se entre a multidão.

E quero ler gente morta com muita frequência, todo dia, ter um livro à cabeceira da cama, ou à mão, em qualquer lugar da casa, onde eu possa esticar as pernas e deixar fluir a imaginação em páginas que contam histórias de vida ou apenas me induzem à reflexão em um poema, sintético ou complexo. Tudo isso faz parte de um prazer raro, para poucos, apenas aos que veem no saber um fator de evolução e de revolução; conhecimento e entretenimento no mesmo frasco. A dose certa? Cada um saberá, de acordo com suas necessidades.

Gente morta me faz valorizar mais minha vida e valorizar gente viva! Uma análise de tudo o que a Literatura mundial representa, em todas as suas manifestações culturais, só é possível por meio da voz dos “imortais”, que não fazem mais parte do plano terreno, mas que inspiram e instigam, por suas ideias e seus ideais, ao ser humano a ser cada vez melhor, principalmente, em humanidade e em alteridade!

O carpe diem ainda é o lema que mais me atrai: viver o momento, aproveitar cada segundo, como se não houvesse amanhã! Depois que eu me tornar “gente morta” quero, como autora, com meus poemas, contos, crônicas, romances, ser inspiração e motivo de reflexão para os que seguirão sua jornada nesta vida terrena. Essa é imortalidade que todo escritor/poeta/artista almeja, mesmo que as “luzes da ribalta” não recaiam sobre si, em vida!

3 thoughts on “IMORTALIDADE

  • Sérgio Luiz Maybuk

    Ler os textos da Cleusa Piovesan é sempre um prazer. O texto imortalidade muito bem escrito e serve para uma boa reflexão. Parabéns.

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  • Belíssima, mais um motivo para continuar e que mais pessoas possam ler, pensar, evoluir como espécie humana.

    Resposta

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